BLOG COLETIVO, os temas são variados.
Tudo começou em 2004 numa comunidade de gente 'madura' do orkut, aos poucos cresceu a amizade e sintonia, apesar de vivermos em diferentes lugares. Participamos da comunidade fechada Jiló com Miolo no orkut, no Facebook, e no blog mostramos nosso 'espírito jiló'.

Um dedo de prosa...

- Tardi, Dotô.

- Boa tarde. Sente-se.

- Careci não. Ficu di pé, memo.

- Sente-se para eu poder examinar.

- O Dotô é quem manda.

- Mas fale-me. O que está acontecendo?

- Ai, Dotô! Mi dá umas dor di veiz in quandu.

- Que dor?

- Aqui, óia. Nu estromagu. Beeem lá nu fundinhu.

- Forte?

- As veiz. Trasveiz é anssim ó, di mansinhu.

- E o que você faz?

- Tem veiz que eu cantu. Trasveiz eu vô pra cunzinha fazê um bolu.

- Tem outra dor?

- Tenhu, sim, Dotô. Aqui, ó. Pertu dus óio.

- E essa é forte?

- Também é forte não. Quandu ela dá eu cunversu cas vizinhas. I passa.

- Outra?

- Tenho sim senhô. Aqui. Anssim, nu meio das custela, pareci nu coração. Dá uns apertu aqui, ó.

- E você faz o que?

- Tem veiz qui eu choru. Trasveiz eu ficu anssim, muitu da queta pra vê si passa.

- E passa?

- As veiz. Trasveiz eu vô pra pracinha. Lá eu sentu num bancu vê as criança brincá prá esperá passá.

- Você mora com alguém?

- Moru não, Dotô. Sô sunzinha nessi mundão di Deus.

- Não tem família?

- Aqui tenhu não. Minha famia é todinha du interiô du sertão, pertinhu de Urandi, lá quasi im Minas. I vim sunzinha pra Sum Paulu tentá a vida.

- E você faz o que?

- Óia, Dotô. Eu já fiz um cadinhu di tudu nessa vida.Já trabaiei numa firma di limpeza, já cuidei di criança. Já trabaiei numa casa di genti rica.Agora eu trabaio cuma mocinha qui mais viaja qui fica Im casa. Ela avua num avião di dia I di noiti. Aí eu ficu sunzinha.

- Você mora com ela?

- Moru sim, Dotô. Ela dexa eu drumi num quartinhu lá nus fundu da casa.

- Sabe cozinhar?

- Oxa si não! Cunzinhu muitu du bem! Coisa mais simpres anssim i coisa mais di genti chiqui.

- Gosta de crianças?

- Ô, seu Dotô. É as criaturinha mais anjinha qui Deus botô nu mundu!

- Qual o seu nome mesmo?

- Óia, Dotô. Eu num gostu muitu, mas a modi agrada a santa, minha mainha botô Crara.

- Dona Clara. Eu sei o que a senhora tem.

- Comu anssim, si o Dotô nem incostô nim mim?

- O QUE A SENHORA TEM DONA CLARA, CHAMA-SE SOLIDÃO E É A CAUSADORA DE TODA ESSA TRISTEZA.

- I issu mata, Dotô?

- Ás vezes, sim. Mas, no seu caso bastam amigos, alguns remédios e um pouco de carinho. Dona Clara. Vai parecer estranho e nem eu mesmo entendo porque estou fazendo isso, Mas minha esposa está grávida e nosso segundo filho é para o mês que vem. Já temos uma menina. E até hoje é minha esposa que cuida de tudo. Porém, com o bebê pequeno precisamos de alguém que cuide da casa. Que tal ficar conosco?

- Oxa si não! Óia, Dotô. Nunca fizeram issu pur mim não. Vixe! Vai sê coisa muitu da boa ficá cum oceis. I careci di morá lá, Dotô?

- Sim. Temos um quarto vago, no apartamento. Podemos tentar por uns meses.O que acha?

- Dotô. É Anssim como tê famia, né?

- Quase.

- Dotô. Eu num vô mais sê sunzinha? Vixe! Deus lhi pague, Dotô, a modi qui carinhu anssim, nem mainha mi dava.

- Vamos testar. Combinado?

- Cumbinadu. Dotô. Careci di eu fazê uma pregunta. Eu num vô mais senti essas dor?

- Vamos combinar uma coisa ? O dia que sentir essa dor você me procura.

- Prá modi Du senhô mi inzaminá?

- Não. Prá modi nóis trocá " dois dedinhu di prosa."



Autora: Sandra Pontes

http://sandrapontes.com/

Parabéns pela sensibilidade e beleza do texto.

Recebi o texto apócrifo por email e reproduzi aqui. Peço desculpas pela omissão da sua autoria.

5 comentários:

Unknown disse...

Côtadinho do dotô!
Mas é a pura verdade, ele é gente, carente também!!!!

IZILDA disse...

Que graça de texto, Beth... Adorei!

Anônimo disse...

Que lindo.

As necessidades humanas.

Adorei (2)

Santa Panela disse...

Agradeço a publicação do meu texto.

http://sandrapontes.com/?p=594

BethSampaio disse...

Já coloquei o nome da autora deste belíssimo texto, Sandra Pontes.
O melhor foi poder conhecer seu blog e ver coisas ainda mais bonitas.

A intenção foi únicamente de divulgar um trabalho bonito e sensível.

Parabéns.