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bolinho caipira de Jacareí


Onde começa a história do bolinho caipira de Jacareí?

Para mim começou por aqui:

Nas ultimas décadas de 1800 duas pessoas vem ao mundo em continentes distantes e tornam-se, de alguma forma, difusores do que hoje é o tradicional bolinho da cidade.

Era inverno na Pomerânia, norte da Alemanha, quando August, agricultor, sofria com a falta de trabalho e ouviu sobre uma viagem para “um lugar onde tudo se plantando dá”. Chegando em casa, sua esposa Ernestine preparava a sopa enquanto os três filhos se aqueciam perto do fogão aproveitando o calor que a lenha proporcionava. Entusiasmado contou sobre o navio que partiria em fevereiro para um lugar quente, bonito e onde poderiam trabalhar e ter dinheiro para que os filhos pudessem crescer.

Ele tinha 56 anos e, viúvo, fazia quase 10 anos que estava casado com a nova esposa que tinha 40 anos, mulher de aparência frágil, porém com energia para seguir o marido. Decidiram arrumar as coisas e partirem de Hamburgo para a vida nova. Foi uma difícil jornada junto com tantas outras famílias que tinham o mesmo sonho.

Depois de dois meses no mar chegaram ao porto de Santos e foram encaminhados à Hospedaria dos Imigrantes onde passaram alguns dias até decidirem embarcar no trem com destino ao Vale do Paraíba para trabalhar nas plantações de café. A família desembarcou em Jacareí para trabalhar numa fazenda. A meninas Mathilde e Albertine eram maiorzinhas e Edouard tinha 4 anos. E com ele a história do bolinho continua.

August veio a falecer pouco mais de um ano da chegada. Para ajudar na casa as meninas começaram a trabalhar numa indústria têxtil. Ernestine gostaria de ter voltado para sua terra, mas esse sonho não se realizou.

Eduoard tinha 7 anos quando nasceu um bebê na casa vizinha, todas as crianças se alvoroçaram para ver a criancinha da casa dos portugueses, era a menina Ana Rita, filha de dona Julia que acabava de nascer. Uma tarde os alemãezinhos foram chamados para ver a menininha no berço. Uma das tias que lá estava se dirigiu à Edouard e vacinou: “Nasceu a sua noiva”.

E foi assim. Cresceram juntos e quando a menina completou 14 anos vestiu grinalda e flores de laranjeira para se tornar a esposa de Edouard, então com 21 anos trabalhava no comércio.

A nova família crescia e cada vez mais dificuldade para criar os filhos. Ela tinha o apelido de Nicota e ele era Edo. Dona Nicota era excelente cozinheira, e ela criava como podia receitas com os parcos recursos para alimentar a família. Edo era um homem recatado, quase tímido, sofrendo preconceitos por sua ascendência germânica em um momento político-social conturbado no mundo com a Primeira Grande Guerra. Não conseguia boa remuneração nos trabalhos que encontrava.

Foi numa conversa ao pé do fogão de lenha, como fizeram August e Ernestine, que Edo e Nicota decidiram mais uma vez mudar os rumos da família para garantir a sobreviência. Era o ano de 1925 e compraram um box no Mercado Municipal de Jacareí e lá montaram o Botequim do Café. Nicota preparava salgados e doces, o ponto ficou conhecido e muita gente começou a ir ao mercado provar os quitutes daquela senhora pequena que produzia grandes sabores. E dentre tudo que fazia o que tinha mais destaque eram os bolinhos de farinha de milho branca recheado com carne de porco que ela havia aprendido com a mãe, eram os prediletos de Edo também que a ajudava no botequim com as compras e a contabilidade.

Esse bolinho chamado de “caipira” (que é como é chamada a pessoa que vive na roça) deve sua criação aos tropeiros que passavam pelo Vale do Paraíba em direção ao interior, onde primeiro foi cultivado o milho, vindo dos países do leste da América do Sul. O milho é o alimento de milhares de anos dos povos da região do atual México e que primeiro se espalhou para o sul e depois para o mundo. Quando os tropeiros voltavam carregavam a farinha de milho pois era mais leve que a de mandioca para carregar no lombo dos burros, e a carne de porco para o recheio encontravam nas pequenas criações pelo caminho. Foram os primeiros tropeiros que trouxeram o milho para a região do Vale, ensinaram a fazer a farinha e o bolinho. Como seu caminho acompanhava o percurso do Rio Paraíba do Sul, rico em peixes, uma das variações do bolinho era com recheio de peixe, principalmente o lambari.

E entre 1925 e 1953 dona Nicota trabalhou dia e noite fazendo seus quitutes e fritando bolinhos. Ficou viúva e continuou na labuta para criar os filhos. As filhas mais velhas a ajudavam no Botequim até quando ela, já envelhecida, tinha dificuldades para continuar com esse encargo e vendeu o negócio, que continuou no Mercado por muito tempo ainda.

Octávia, irmã de Nicota casou-se com um soldado e foram morar em Caçapava onde tinha um batalhão do exército e lá seguiu o exemplo da irmã para ajudar a família, difundiu o bolinho caipira usando a farinha de milho amarela que era mais comum.

Devagar a simples receita de farinha, água e carne se espalhou por todas as cidades da beira do rio e em cada uma tem uma nota diferente, um tempero, um modo de fazer.

A receita original que dona Nicota fazia no Botequim do Café em Jacareí e que tornou apreciado o bolinho caipira é essa:

BOLINHO CAIPIRA DE JACAREÍ

(receita da minha mãe, original da minha avó Nicota)

ingredientes:
1 prato fundo de farinha de milho branca
1 colher cheia de polvilho (de preferencia doce)
1 maço de cheiro verde, predominando alfavaca (o majericão miúdo)
sal a gosto

como fazer:
Misturar bem com as mãos, esfarelando, adicionando água em temperatura ambiente até dar ponto para enrolar.
O recheio pode ser linguiça ou carne de porco picadinha,
o recheio mais pitoresco é com peixe, principalmente lambari.
Fritar em oléo bem quente.

por Jussara Gehrke, neta de Edo e Nicota

Um comentário:

Merciasz disse...

eu tb sou caipira...
eu já comi este bolinho...( muito do bom)